27 dezembro, 2006

ENTENDIMENTO INDIGESTO DA ANOREXIA

A imprensa continua publicando casos de jovens modelos, que no "afã de se tornarem perfeitas ou impecaveis" na modelagem de seu corpo, terminam por morrer de tanto praticarem um sistemático jejum, que acaba por torná-las anoréxicas irrecuperáveis.
Poucos acreditam que o fator estético seja a maior das justificativas para se levar uma privação alimentar a extremos tais que conduzem inexoravelmente à morte. O próprio anoréxico não se dá conta de que mente para si mesmo, ou melhor, de que suas justificativas não são senão uma forma disfarçada do suicídio, com o qual ele firmou um compromisso inarredável e bem dissimulado até para si próprio.
Tudo depende de como se lida com a fome, desde quando ela se apresenta a nós no começo da vida extra-uterina, quando se interrompe a alimentação umbelical. A fome é uma sensação incômoda e, se não satisfeita, ela nos mata. Por isso é que dizemos que temos que matar a fome.
A expressão é comum, todos a conhecem sem maiores explicações. Para a maioria dos seres humanos o problema encontra certo apaziguamento e, em grau maior ou menor as pessoas se ajustam ao seu biotipo hereditário: magros, atléticos e gordos.
Os anoréxicos e os bulímicos (esses que comem até vomitar), no entanto, não encontram uma forma adequada de lidar com a fome, já que esta lhes parece uma "encarnação da morte". Os anoréxicos querem matar de fome a própria fome. Algumas modelos quando se vêem magras sentem-se triunfando, cada vez mais próximas da vitória final, que no entanto, também, as mata.
Os bulímicos usam um recurso inverso, que é o de não dar chance à fome de se manifestar. Temem-na. Por isso comem de maneira contínua, até que o vômito as tranquilize por algum tempo. Pelo tempo que dura a saciedade transitória.
É bem visível que tanto os anoréxicos quanto os bulímicos, num nível inconsciente profundo, pagam o preço de um problema mal elaborado com a imagem internalizada de sua mãe, com o seu seio, em sua realidade interna. Os anoréxicos não perdoam a mãe que os obriga ao convívio com a fome, e querem matar a mãe interna, por idêntica imposição: de fome; os bulímicos nem querem ouvir falar de fome e por isso se dão um alimento constante e, com isso, se representam melhores que sua propria mãe, que dispensam arrogantemente.
A anorexia e a bulimia às vezes co-existem, alternadamente numa mesma pessoa.
No fundo, é uma patologia semelhante à dos homens-bomba islamicos, jovens, que não passam de deprimidos-suicídas, que desfilam nas passarelas do heroismo, embalados nas promessas de um hedonismo celestial, aplaudidos pelos que os preparam, mas escolhem sobreviver.

4 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Até que enfim uma matéria inteligente e lúcida sobre este problema que já suscitou um número imenso de besteiras politicamente corretas! Das mais corriqueiras são atribuir a culpa às exigências estéticas do "modernismo" (lembram da Twiggy, há mais de 30 anos?) ou às exigências das revistas e firmas de modelos. Suicídio assusta a maioria das pessoas e fogem de falar nele como o diabo da cruz! Parabéns! Deve ser lido e divulgado, embora quem não é do meio certamente não vai entender e achar maluquice.

5:45 PM  
Anonymous Anônimo said...

Achei muito bom o texto sobre anorexia. Em poucas palavras você disse muito e explicou com a profundidade de sempre o que motiva esse horrível caminho dessas jovens!
Depois nos falamos.

9:15 AM  
Blogger Sujeito Oculto said...

Caro Zusman,
muito interessante essa explicação psíquica sobre anorexia e bulimia. Eu a desconhecia, assim como provavelmente todos os jornalistas da nossa imprensa sensacionalista que saturou o assunto com matérias pueris sobre como o mundo da moda mata nossas jovens.

Imagino que além da própria fome, que causa as sensações mais diversas (nosso corpo cria recursos para lidar com ela. Jesus, por exemplo, alucinava no deserto), existem os remédios para emagrecer, como anfetaminas e outros, que se misturam á doença num ciclo que pode terminar com a morte.

Não podemos nos esquecer de que os estilistas têm grande parcela de culpa, pois exigem cabides humanos para pendurar suas roupas e exibi-las nas passarelas – cabides esses que são superexpostos pela mesma mídia sensacionalista como modelos de beleza.

9:51 AM  
Anonymous Anônimo said...

olá sr waldemar, é sempre muito bom ler seus textos. a sua visão sobre esses assuntos realmente traz muitas reflexoes.

um abraço!
aproveitando o assunto atual... que tal escrever sobre essa onda de violencia e milicias?
seria interessante.

8:41 PM  

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