22 julho, 2006

O QUE DEU NA CABEÇA DE ZIDANE

Passada a perplexidade das primeiras horas e dos primeiros dias, talvez já se possa refletir com maior profundidade sobre a cabeçada de Zidane, fato que produziu uma inesperada transformação no término de uma Copa que chegava ao seu fim obedecendo às regras conhecidas do campeonato internacional de futebol.
Sabia-se que Zidane anunciava o encerramento de sua exitosa carreira esportiva, internacionalmente reconhecida e aplaudida. Havia uma festividade preparada para a celebração deste êxito apoteótico.
A intempestiva cabeçada de Zidane nos minutos que precederam o final da prorrogação fez crer que um fator de enorme importância se sobrepôs àquele grande final que ele preparara para sua despedida gloriosa.
Logo se começou a querer adivinhar o xingamento com que fora atingido pelo jogador italiano, com quem acabava de disputar uma bola. Transpirou então que Materazzi falara mal de sua mãe e sua irmã. Para muitos, os xingamentos justificavam a cabeçada. Para outros, no entanto, o gesto de Zidane soava como uma resposta exagerada aos insultos de Materazzi.

Afinal, Zidane era já um pré- quarentão e tinha bons motivos para postergar um possível acerto de contas com Materazzi. Ademais, isto se sabe e se vê: jogadores estão sempre se agredindo física e verbalmente, durante a partida. Mas, tudo se acaba junto com o lance e com o apito do juiz.

Que outro fator poderia ter levado o jogador francês ao desespero da cabeçada? O jogo estava empatado e em poucos minutos se encerraria. A resolução iria se dar por pênaltis.
Zidane sabia que ele seria convocado para este chute. O temor de que não fosse marcar o gol da vitória e assim não fechar com selo de ouro sua última partida, seu último chute, pode tê-lo levado a supervalorizar os xingamentos de Materazzi. Acertar no italiano era mais seguro. E foi.

Levado pelo medo acertou Materazzi bem no meio do peito. Na hora do medo, virou machão. Foi uma cabeçada de quem perdeu a cabeça. Esqueceu o futebol e partiu para a barbárie... e mergulhou de cabeça.

7 Comments:

Anonymous Anônimo said...

muito bom!

10:23 AM  
Anonymous Anônimo said...

muito interessante...

11:33 AM  
Anonymous Anônimo said...

Waldemar querido,



E claro que concordo com a tua visão do humano medo de errar do
Zidane, mas gostaria de acrescentar algumas informações que nao sei
se chegaram aqui.
Estava em Roma na época da Copa e o que saiu nos jornais alemães e
ingleses sobre os italianos foi o seguinte:
-primeiro, como vocês já devem saber, o técnico da seleção italiana,
o goleiro e outros estão indiciados judicialmente por fraude e
corrupção no ultimo Campeonato de futebol. Coisas gravíssimas, tanto
que quase eles nao participaram da Copa...
Dai que a imprensa estrangeira nao podendo ataca-los excessivamente
sobre esse fronte (porque e' uma questão italiana) publicaram que
eles sao "mammoni" (filhinhos de mamãe), excessivamente vaidosos,
preocupados com a aparência, imaturos, etc., nas primeiras paginas
dos jornais. Imagina o que essas declarações (a meu ver pertinentes,
mas nao durante o evento da Copa...) provocaram na Itália ...
Debates e mais debates sobre se eles eram imaturos ou nao, como eram
os alemães, os ingleses, foi quase um conflito diplomático,
principalmente com os alemães.

Outra coisa: no dia seguinte da cabeçada do Zidane foi publicado nos
jornais italianos que a leitura labial do Zidane deu o seguinte:
"você e' um terrorista de merda"...(e nao ofensas sobre mae ou irma...)

Entao, quando foi ao ar o filme do depoimento do Zidane sobre a dita
ofensa provocadora (nao a caso dirigido e orientado pelo grande
Bresson), me perguntei "quanto somos manipulados nos pela informação"?
Como me disse um motorista de taxi romano:
- essa Copa e' feia porque na verdade e' entre a Nike e a Adidas.

Outra coisa: a rivalidade entre as velhas culturas na Europa e'
latente depois da unificação (artificial) e cada evento onde a
competição e' a mola reacende o estopim das rivalidades, alem do
imenso desconforto deles com relação `a invasão de imigrados e de
outras formas de "indesejada e ameaçadora" fusão cultural...

Bom, fico por aqui com a minha contribuição de informação e reflexões.

Beijos, saudades de você e de momentos mais tranqüilos neste planeta,

Lucia

9:03 PM  
Blogger Sujeito Oculto said...

Zidane é árabe e para os árabes a honra conta. Os franceses são muito globais na hora de utilizar jogadores negros e argelinos para vencer uma Copa do Mundo, mas no país, a história é bem outra.

Se pensarmos bem, a honra da família de Zidane (só consegui ler Putana e Sorella nos lábios de Materazzi) é mais importante do que uma copa para um país que só o aceita por sua utilidade, pois se fosse um argelino qualquer (sei que nasceu em Marselha, mas isso não faria diferença para os franceses "de souche") estaria à margem dessa sociedade xenófoba que é a França.

1:48 AM  
Blogger Zusman said...

Meu caro sujeito oculto, grato por suas contribuições, creio que elas ajudam a precisar mais a hipótese de que me socorri para entender o gesto de Zidane.
O preconceito a que Zidane estaria exposto pela xenofobia dos franceses leva-lo-ia muito mais a ferir um outro francês do que um italiano, que era quem xingava sua família. A não ser que o desmantelamento de sua festa com a cabeçada estivesse servindo para desqualificar tanto a ele quanto aos franceses que confiaram nele.

10:21 AM  
Blogger Zusman said...

Querida Lucia, não ignoro essas rivalidades entre países que fazem competições esportivas, porque os esportes são, a meu ver, uma tentativa de eufemização das guerras, e isso é bem visível pela presença de um juiz e de observadores (bandeirinhas) que dão punição aos transgressores. As vezes, falha. Mas na guerra vale tudo: guerra é guerra. Vou dentro em pouco, já que tocamos no assunto, blogar sobre isso.

10:28 AM  
Anonymous Anônimo said...

Você tem razão. Há tempos o futebol parou de desviar o foco das atenções políticas. Creio que a última vez em que a Copa do Mundo foi utilizada politicamente de forma descarada foi na Argentina em 1978, com roubalheira e tudo. Vale lembrar que, durante uma guerra entre os Congos (um era Zaire na época), o Santos foi jogar em ambos os países, que estabeleceram uma trégua de alguns dias para assistir ao Pelé. Nunca ouvi falar de outra pessoa (além de Gandhi) que tivesse parado uma guerra apenas por sua presença. Quantas vidas foram salvas por três jogos?

11:06 AM  

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